De anões e gigantes

03/02/2009 19:00

O caso Amauri na seleção tem muitos matizes. Não se resume apenas a convocar ou não o cara, a ele aceitar ou não. É o caso de se desenvolver as idéias. É o que farei abaixo.

Primeiramente, o fato de Dunga ter “cedido”. Não é bem assim. Dunga, como se sabe, só cede a uma pressão, e não é da torcida nem da imprensa. A convocação-tampão de Amauri, porém, parece ter tido mais o objetivo de esfregar qualquer coisa na nossa cara. Algo do tipo “Vocês querem Amauri? Pois tomem Amauri! E não reclamem!” É muito pouco provável que o treinador (e a CBF) tenham tão rapidamente “perdoado” o jogador por ter dito que não precisa de nenhuma seleção. E, de fato, não precisa.

Amauri te despreza

Amauri saiu do futebol amador de Santa Catarina para as divisões inferiores da Itália, onde passou a galgar degraus até chegar ao ataque titular da Vecchia Signora. Sozinho. Fazendo gols. Sem publicidade, sem ser plantado em convocações (Afonso, Bobô e Fernando?), sem atuações espertinhas de empresários/relações-públicas. O que é muito louvável e raro no mundo do futebol de hoje. A chegada à seleção, qualquer que seja ela, seria uma recompensa por seu talento e sucesso, como deve ser sempre. E não trampolim, como é o caso em muitas vezes (Afonso, Bobô e Fernando?).

O problema é que, para Amauri, ir para a seleção brasileira seria mais uma punição do que um prêmio, porque ele nunca será aproveitado com a camisa canarinho. Não é mais um garoto (tem 28 anos), então não representa uma renovação propriamente dita, que é o que a seleção precisa. Sim, pode ser aproveitado a curto prazo, na Copa, por exemplo. Mas aí entra o fator Dunga.

"Não contavam com minha astúcia!"

Dunga, já me conformei, comandará o Brasil na África do Sul. Não dá sinais de desgaste entre os que ele realmente quer (e consegue) agradar. Assim sendo, é perfeitamente lógico concluir que o time que entrará em campo na estreia da Copa do Mundo terá Júlio César, Maicon, Juan, Lúcio, (lateral-esquerdo indefinido, talvez Marcelo); Gilberto Silva, Josué, Elano/Ronaldinho, Kaká; Robinho, Luís Fabiano. A menos que algum desses se machuque, Dunga manterá sua base. Não há, portanto, lugar para Amauri no time titular enquanto no banco estiver o ex-capitão.

Isso se Amauri chegar na Copa, pois Dunga tem um histórico de descartar convocados sem vê-los jogar. Ele deve pensar que um par de partidas sentadinho ao seu lado bastam para saciar a vontade de qualquer boleiro. Quando consideramos, então, que Adriano, Alexandre Pato e Jô são as alternativas preferidas do treinador para o ataque, podemos ver que o futuro da Amauri na seleção não é muito brilhante.

Na Itália saberiam dar a ele o valor e as chances que ele merece. Não só porque lá ele é adorado, mas também porque a Azzurra não tem titulares definidos para o setor ofensivo, até porque os escolhidos por Marcello Lippi costumam não repetir no time nacional as atuações que têm em seus clubes. As vagas estão completamente abertas, ao contrário do Brasil, onde são petrificadas.

Dunga, com os convocados a seus pés

Mas não é preciso nem chegar tão longe para ver que Amauri e a seleção brasileira não estão exatamente indo ao encontro um do outro. Basta ver as circunstâncias em que ele foi chamado, como eu disse acima. Sem critério, sem pensar no assunto, dias depois de Dunga dar mil motivos para não chamá-lo. Em suma, de birra do técnico com jornalistas especializados e torcedores. Como um garotinho de dez anos que atira raivosamente os cobertores sobre o colchão quando a mãe manda-o arrumar a cama, só para dizer que arrumou.

A falta de critério é clara quando analisamos o grupo selecionado para o amistoso. Dunga já havia chamado dois jogadores com as mesmas características de Amauri: Adriano e Júlio Baptista. Os três são grandes, bons cabeceadores e têm chute potente e certeiro. Se Dunga tivesse realmente se preocupado com o substituto de Luís Fabiano, teria escolhido alguém com o mesmo estilo do avante do Sevilla. Em vez disso, preferiu jogar tudo para o alto e fazer mais uma de suas rabugices.

"Qual vai ser o meu chilique de hoje?"

Mas claro, nada disso importa mais, já que a Juventus bateu o pé e disse que seu jogador fica. Os caminhos do anão Dunga e do gigante Amauri não se cruzarão desta vez, e o melhor que cada um tem a fazer é seguir na sua estrada. A do gigante parece iluminada e tranquila. A do anão, indefinida e tortuosa. E nós vamos com ele, de reboque, melancolicamente impotentes, assistindo ao gigante dar seus passos largos.

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